sexta-feira, 3 de maio de 2013

Alegoria narrativa de Gamal Ghitany leva leitor a jornada mística e erótica pelo deserto egípcio



A Editora Estação Liberdade introduz no Brasil a obra do grande sábio das letras árabes, Gamal Ghitany, após ter publicado autores tão diversos desse universo, como Rachid Boudjedra e Rafik Schami. No romance de Ghitany, traduzido diretamente do árabe egípcio por Safa Jubran, um velho habitante do Cairo acorre um dia ao país do poente levando consigo uma extraordinária história de errância, de revelações e de imposições divinas; logo o sultão ordena que um de seus secretários registre em detalhes seu relato místico e emocionante.
Tudo começa em sua morada no Egito, na noite em que Ahmad Ibn-Abdallah ouve uma voz misteriosa dizendo-lhe: “Parta!”. O chamado ordena-lhe que siga sempre em direção ao poente, e, quanto mais a voz ecoa, mais Ahmad deixa para trás seus entes queridos e tudo o que havia construído.
Tem então início uma jornada de autoconhecimento e reflexão, na qual o estrangeiro se deparará com personagens enigmáticos, desafios extraordinários e as mais inesperadas experiências. Aprenderá a arte da navegação no deserto com a caravana de Hadramawti, a descoberta do amor num oásis negligenciado pelos mapas, a força enlouquecedora do poder no fabuloso Território das Aves, a experiência caótica do povo dos bastões. Caminha sem bagagem alguma, mas adquire alguns pertences ao longo do caminho: uma caneca, um pequeno odre de couro e três livros — um deles muito misterioso, com páginas em branco.

Viagem rumo ao desconhecido que alia mistério a erotismo, seriedade a humor e a tradição narrativa das Mil e uma Noites ao multifacetado romance contemporâneo, o conto maravilhoso do escritor egípcio Gamal Ghitany é, ao mesmo tempo, uma sátira aos regimes políticos do mundo árabe, uma meditação sobre a vida humana e um hino à beleza do mundo.

O autor
Gamal Ghitany nasceu em 1945, no Alto Egito, de família modesta. Muda para o Cairo ainda criança, e o antiquíssimo bairro de Al-Gamaliya será tema recorrente de sua obra. Publica sua primeira coletânea de contos aos 14 anos. Estuda artes e com 17 anos já trabalha como desenhista de tapetes. Ingressa aos 23 no mundo jornalístico e cobre como correspondente de guerra grandes conflitos do Oriente Médio, como as três guerras entre Israel e os países árabes. Publica cerca de 30 obras e se estabelece como um dos grandes romancistas e homens de letras do Egito, buscando inspiração na cultura árabe clássica e no sufismo. Em 1980 recebe o prêmio nacional de literatura do Egito, e em 1987 a França o nomeia Chevalier des Arts et des Lettres. De 1993 a 2011 é editor-chefe da Akhbar Al-Adab [Notícias culturais], a mais importante publicação literária do país. Entre suas principais obras estão as inéditas no Brasil O misterioso caso do beco Zaafarâni, O livro das iluminações e As poeiras do desaparecimento.

A tradutora
Safa Jubran é livre-docente pela Universidade de São Paulo e professora do Departamento de Letras Orientais da mesma instituição. Pesquisa literatura, filologia e linguística árabe, e é membro do conselho do períodico Circumscribere. Entre suas traduções estão Tempo de migrar para o norte, do sudanês Tayeb Salih; Porta do Sol e Yalo, filho da guerra, do libanês Elias Khoury; e Eu vi Ramallah, do palestino Murid Barghouti.

Trechos
“O desvalido diante de Deus, rogador de Seu perdão, buscador de Seu afeto, Ahmad Ibn-Abdallah Ibn-Ali Ibn-Awad Ibn-Salâma, Aljuhani, Assaîdi, nascido no Cairo em terras do Egito, disse que sua saída de sua pátria se deu na quarta-feira, no nono dia do mês de maio, há quarenta e cinco ou talvez cinquenta e cinco, ou quem sabe há setenta e cinco anos. Aconteceu há tanto tempo que a coisa fica confusa, precisá-lo é difícil, determiná-lo e compreendê-lo é complicado!” 

“Enorme é o poder da intenção sobre os atos, diziam os sábios. Um homem pode caminhar uma hora e é possível que a fadiga o alcance antes de completá-la; em contrapartida, se decidir atravessar uma distância de dez horas, talvez só comece a se sentir cansado ao cabo de sete ou oito horas. O corpo se adapta às intenções, aos desejos do seu dono, dizia o hadramawti. Por ouvi-lo de pessoas confiáveis e por experiência própria, ele podia garantir que não havia limites para a adaptação do homem!”

“A existência humana tem forma circular, começa numa ponta e prossegue sua curva até o momento em que as coisas se aclaram, em que o fim e a origem se aproximam. O encontro ocorre no momento do poente.”

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