quinta-feira, 11 de junho de 2015

Livro 'As sete vidas de Nelson Motta' extenua relato das noites musicais

 Jornalista, compositor e produtor musical com livre trânsito nos bastidores da MPB e do pop nacional, Nelson Motta é testemunha ocular e auditiva de antológicos momentos da música do Brasil. Parte do que viu e ouviu o artista multimídia - de origem paulistana, mas vivência carioca - narrou em Noites tropicais(Objetiva, 2000), livro saboroso no qual fez relato informal de suas memórias musicais. Igualmente irresistível, a biografia do cantor e compositor carioca Tim Maia (1942 - 1998), Vale tudo - O som e a fúria de Tim Maia (Objetiva, 2007), reiterou a habilidade de Motta para descortinar bastidores musicais em narrativa envolvente. Livro idealizado para festejar os 70 anos completados pelo escritor em 29 de outubro de 2014, As sete vidas de Nelson Motta tem menor fôlego e poder de sedução. Dos 96 textos enfileirados nas 226 páginas do livro, sem divisões por capítulos, 27 são inéditos, tendo sido escritos para o projeto. Os demais são crônicas, geralmente sobre música, publicadas originalmente pelo autor em jornais como o já extinto Última hora (entre 1967 e 1969) e O Globo (no qual Motta assinou coluna diária sobre O Globo nos anos 1970). Nem todos resistiram bem ao tempo. Dentre os que ainda hoje soam relevantes, pelo caráter visionário e pela coragem de expor o que já era sabido mas não escrito, destaca-se Ídolo sim, líder não, crônica da Última hora em que Motta criticou a omissão de Roberto Carlos - cantor capixaba então entronizado no posto de Rei da juventude brasileira - pelo fato de o artista se recusar a tomar posição em relação a assuntos que mobilizam os jovens dos efervescentes anos 1960.
Atitude (ou falta de) caracterizada por Motta na crônica como "reacionarismo" - palavra que, como se sabe hoje, volta e meia é associada a Roberto Carlos. Outro texto bem interessante - e de certa forma atual, diante das agressões a gays noticiadas cotidianamente na mídia - é O masculino e o feminino. Nesta crônica, publicada em O Globo em 1975, Motta sai em defesa de Ney Matogrosso, então vítima de campanha difamatória orquestrada pelo jornalista, compositor e produtor musical Carlos Imperial (1935 - 1992) por conta da libertária postura andrógina adotada pelo cantor no palco e na vida. Vale registrar também Meio gente, meio bicho, não exatamente uma crônica, mas breve e preciso comentário feito por Motta na segunda metade dos anos 1960 a respeito do público de Maria Bethânia ("entusiasta, estranho") e da figura magnética da intérprete baiana ("Ela é uma das personalidades mais fortes e fascinantes que conheço. De seu olhar duro, de seu corpo esguio, de suas mãos nervosas mas firmes, emana uma estranha e invencível força. Ela canta o que tem vontade, veste o que lhe dá na cabeça, age sempre com absoluta coerência em relação às coisas em que acredita, na vida e na arte"). Boa parte dos textos antigos, contudo, hoje são meramente curiosos. Já os textos atuais parecem sobras de Noites tropicais, livro no qual Motta já contou tudo o que quis - e o que pôde - contar de mais relevante e interessante. O texto sobre a abertura da discoteca Dancin' Days, por exemplo, soa déjà vu. Sem falar que a edição do livro resulta por vezes confusa. Na intenção de "trazer o passado para o presente", como diz a nota sobre a edição publicada ao fim do livro, textos antigos e inéditos são entrelaçados sem menções a datas. O que salva As sete vidas de Nelson Motta é a fluência da escrita de Motta, o jornalista, dono de texto sedutor, tanto ontem como hoje. Mas nem essa habilidade para prender o leitor pela escrita atenua a sensação de que o livro têm folego mais curto do que obras anteriores do escritorsetentão, estendendo extenuando o relato musical de dias e noites tropicais.

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